Natacha Macsan
Sobre as Redes: o uso de filtros.
Eu estava navegando pelas redes e... caiu na rede é peixe.
Vi que retornou um debate - porque esse debate não é novo - sobre o uso de filtros nas redes sociais e agora uma rede famosa está dizendo que não vai mais contratar influencers que usarem filtros nas suas edições e que vai, inclusive, usar inteligência artificial para detectar se elas fazem uso do recurso.
Bom, eu faço uso de filtro. Isso evita, por exemplo, que eu tenha que fazer maquiagem completa todos os dias e eu acabo mesmo só fazendo o delineado, o batom e o rímel que eu posso ou não usar. Maquiagem, além de serem muitos itens e eles serem caros - a base está bem carinha - também deixam minha pele mais oleosa, em certo momento começa a me incomodar bastante e eu fico bem desconfortável. O pós uso é igualmente estressante, porque você tem que ficar lavando com sabonete para tirar a oleosidade e os restos de maquiagem que ficaram, se você não lava, parece quando você sua a mão de doce e tenta limpar com guardanapo, fica aquela coisa meio gosmenta.
Outro fator e o principal deles é que a mulher é muito cobrada na sociedade pela sua vaidade e isso acaba sendo um "paralisante" das suas ações. Não só vaidade, como zelo também. A mulher às vezes deixa de sair porque a unha não está feita, a roupa não está boa no corpo que foi inchando ao longo do dia e perde a oportunidade da experiência por causa de coisas que muitas vezes as pessoas ao redor nem estão dando tanta atenção. Como eu sei? Eu não pinto as minhas unhas (claro que elas estão sempre limpinhas) por causa do violão e ainda tem mais: as unhas de uma mão são curtas e as da outra mão são grandes e ao longo dos 20 anos em que toco violão, só duas pessoas efetivamente repararam isso. Ou seja, a maioria das pessoas está pouco se lixando. A mulher quer arrumar a casa antes de começar a fazer o que precisa fazer e, às vezes, por causa disso, arrumou a casa e não fez a outra coisa... por causa de uma arrumação que nem sequer dura muito tempo. Moral da história: por causa dessas exigências sociais que muitas das vezes imputamos à nós por causa de um conceito cujo observador nem sempre nota, estamos deixando de fazer as coisas que queremos fazer. Por essas e outras eu desapeguei disso e faço a manutenção da casa, por exemplo, quando ela precisa ser feita... nem visita eu recebo... ou melhor, até recebo, mas nunca quando a casa está um brinco. Logo, não vou ficar me aborrecendo mais com o acaso, ele que lute.
Essa cobrança em cima da mulher é também uma auto cobrança se pautando em realidades alheias e observadores inexistentes. As mulheres que acabam se desgarrando disso conseguem alavancar muito mais do que as que se prenderam nessa rede insustentável da vaidade e zelo inalcançáveis ( alouça, meu amor, vai estar suja ao beber de uma água).
E por isso, eu passei a usar filtros. Escolho aqueles que simulariam se eu tivesse com maquiagem e que não afetam muito a estrutura do meu rosto, até porque filtro também não faz milagre. Não podemos nos esquecer, que a câmera "nua e crua" do aparelho celular também NÃO reflete a realidade da nossa aparência, podendo nos envelhecer ou atenuar características negativas, digamos assim, só por causa de um detalhe: a luz. Então, a depender de onde a luz bata você pode ficar com profundas olheiras... mas você não estava com olheiras assim, era só a luz que, vinda de cima, fez sombra na sua região ocular. E, então, se a câmera também não capta a realidade como ela é, muito menos o filtro mostra uma realidade tão distorcida assim. Tem gente que abusa, mas, fazer o que? Cada um com as suas dores.
A questão desse debate sobre o uso de filtros está, de novo, envolvendo a questão da saúde mental de meninas que estão tendo distúrbios de auto imagem, visto que querem sua beleza parecida com a do filtro como se aquela realidade fantasiada não fosse a realidade delas. E aí, nós temos alguns problemas.
A gente não pode trabalhar com transferência de responsabilidade. Essas questões devem ser tratadas com os profissionais adequados e não com a "enfeiamento" de figuras públicas. Cada um é responsável pelas sua saúde mental e não podemos deixar que pessoas que estão claramente doentes acabem adoecendo os outros em uma rede perversa de contaminação coletiva. Pior: essa atitude tem prejudicado bastante o trabalho de mulheres.... como se a vida das mulheres já estivesse muito fácil.
Cabe, também, salientar, que a ifluencer tem acesso à muito mais recurso do que a mulher media. Ela faz tratamento de pele, de beleza... então, não é o filtro que está afetando tanto assim a imagem dela.
Eu me lembro quando a Alicia Keys anunciou que não ia mais usar maquiagem e apareceu com sua pela limpa, linda, natural e reluzente pregando aos quatro ventos a mulher real. Amor, a mulher real com a mesma idade que a sua não está com a mesma pele que a sua e o seu discurso não só não foi libertador, como foi mais opressor. Na época que ela anunciou isso, estava no auge os tutoriais de maquiagem, as meninas estavam bem evoluídas nas técnicas e dividindo isso com todo mundo e as mulheres super empenhadas em valorizar mais as suas linhas faciais, quando, de repente, alguém anuncia: NO MAKE. Quer dizer, quando a mulher média consegue finalmente aplicar a técnica da pele perfeita das artistas; elas, as artistas, informam que não vão mais se misturar com a plebe. E sim, foi assim que eu interpretei. Afinal, ela só vai falar para mim de beleza natural adquirida naturalmente, quando ela passar a lavar o rosto só com sabonete LUX. Aí, amada, aí sim a gente conversa.
Quanto às meninas, a gente precisa falar também da classe social delas. Não me parece coisa das meninas classe média-pobre, que sempre estiveram conformadas com a própria realidade e aquilo a que vão ter acesso ou não. Eu fui menina classe média-pobre (que não é pobre, não passa necessidade, mas também não está por aí esbanjando), que compra sapato uma vez por ano ou quando o sapato arrebenta; e que precisa escolher acuradamente o vestido que vai comprar, porque, se comprar errado e não cair bem, não vai poder comprar outro. A menina classe média-pobre cresceu conformada com a realidade que tem na expectativa de conseguir no futuro boas condições para alcançar tudo aquilo que deseja e poder, finalmente, fazer a unha acrigel com regularidade e não apenas para eventos familiares festivos. Já a menina pobre mesmo, ela não tem internet e, provavelmente, não tem celular próprio, então, a gente não pode sequer cogitar colocá-la nesse debate, porque se ela tivesse ao menos o celular dela, isso por si só já seria a alegria da vida dela.
Podemos deduzir portanto que isso está vindo de uma classe média-alta de meninas que anda bem inconformada com a realidade abastada que tem, mas que não a favoreceu demais e o quanto elas mereciam.
Para ilustrar um exemplo: um dia abri um vídeo costurado lá no Tik Tok. No primeiro vídeo era uma menina super feliz, extrovertida, mostrando alguma coisa que eu não lembro mais o que era. Na sequência, uma menina chorando. Eu não entendi nada, porque nada no vídeo costurado era triste, mas a menina estava chorando. Tentei entender lendo os comentários e foi quando eu descobri: a menina estava chorando porque ela não se considerava tão bonita quanto à outra garota. Eu achei aquilo inacreditável! Até a autora do vídeo foi consolar a pobre menina rica totalmente padrão que estava chorando. Meu parecer: é uma narcisista tóxica que quer estragar a felicidade dos outros imputando a eles culpa! Simples e pura culpa. Culpa por serem quem são, tanto internamente - espontaneidade, alegria - quanto externamente - auto cuidado e zelo. E é claro que a menina do primeiro vídeo era infinitamente mais atrativa do que a menina do segundo vídeo, afinal, a gente busca pessoas que a gente possa trocar energia e não às pessoas que ficam sugando nossa energia o tempo inteiro com as suas insatisfações só porque elas acham que são mais merecedoras da atenção do que as outras. Eu, em particular, de gente assim, estou fugindo.
Eu não vou minimizar aqui que realmente houve um avanço no uso de recursos como o photoshop, por exemplo, mas a pessoa que acompanha rede social achando que aquilo é vida real é a mesma que quer fazer debate sobre Física em filme dos "Velozes e Furiosos". Aí, pelo amor de Deus também, né? A essa altura da vida ainda não sacou que é tudo uma mistura de realidade com ficção?
E a única conclusão que eu consigo chegar no meio desse debate todo travestido de se importar com a saúde mental das mulheres é que não passa de mais uma estratégia para lançar aquele produto super caro que as emocionadas vão comprar só para fazer Reels sem filtro no Instagram e pagar de ryca. Eu não caio nessa, meus amores... o mercado preocupado com nossa saúde mental. HA-HA-HA, faz-me rir. Quero ver sim se eles vão contratar a mulher trabalhadora real com a pele todo oleosa depois de um dia inteiro de trabalho... aham, vão sim. Já estão contratando sim.
Por isso eu digo: o filtro fica.
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