Natacha Macsan
#Opinião: Alcione, o samba morreu.
Ontem e hoje no Twitter, o assunto do momento foi "Alcione, o samba morreu" em referência à uma música da cantora, "Não deixe o samba morrer" e ao vídeo da Gabi Martins, uma cantora compositora do sertanejo, na Marquês de Sapucaí, fazendo movimentos incompatíveis com o samba durante o ensaio técnico da Unidos de Vila Isabel.
Claro, que a cena deu o que falar e isso reacendeu a memória da Mallu Magalhães e sua fala nada feliz "essa é para quem é preconceituoso e diz que branco não pode tocar samba" no Programa Encontro com a Fátima Bernardes e que rendeu um meme, que me desculpe a Mallu, fez jus. A fala foi muito arrogante para uma música muito aquém do que se espera de um samba. Na época, estava rolando uma polêmica com a cantora que fez um videoclipe, clique aqui, rodeada de pessoas negras e, também não podemos exatamente negar, mas ficou meio estranho sim, porque ficou a parecendo a Princesa Isabel rodeada pelos negros suados, porém emancipados... Eu vou ter que concordar com as críticas do Movimento Negro, não ficou de bom tom, ficou estranho sim.
Inclusive, a junção dessas duas cenas rendeu isso aqui:
Pack Gabi Martins sambando +
— Natacha 💙🌹💙 (@namacsan) March 23, 2022
Malu Magalhães cantando samba.
🗣️🗣️🗣️ pic.twitter.com/1TtkzWTktV
Desculpem as meninas, a montagem fui eu que fiz.
Só que eu quero fazer coro aqui com o impacto disso que é da seguinte ordem: em primeiro lugar, não é problema a pessoa fazer um samba. O lance é que não era um samba raiz, era um misto de alguma coisa que não era exatamente samba, mas que soava como algo querendo ser melhor do que é o samba e é esse tipo de arrogância que incomoda. A gente confirma isso através da fala no programa Encontro: "isso é para quem é preconceituoso e diz que branco não pode fazer samba". Quer o nome de um branco que faz samba? Diogo Nogueira. Quer mulher branca? Beth Carvalho. Então, foi ruim, porque a crítica não estava para a cor da pele e, sim, pela qualidade do produto. Fazia uma misturinha a mais, colocava um "samba-alguma-coisa", acrescentava uma dose de humildade, pronto!, resolvia o problema.
Quanto à atuação da Gabi Martins, a minha crítica é mais dura. Em primeiro lugar que eu, na minha humilde opinião, acho que as Escolas de Samba fazem um des-serviço à classe negra quando contratam mulheres famosas para os lugares de destaque nos desfiles. Quem é do meio, ou ao menos sabe como funciona o meio - esse é meu caso -, sabe que as meninas passistas crescem nas Escolas de Samba, passam a vida inteira naquele ambiente e, na hora do Grand Finale, quem é contratada? Uma mulher que não é daquele espaço e que só conseguiu estar ali por uma questão de status e que, para piorar, a performance ainda pode derrubar pontos da Escola de Samba. Se fosse dia de desfile, quantos pontos a União de Vila-Isabel teria perdido com essa performance funkeira da Gabi Martins? Gabi Martins essa que poderia ter respeitado os próprios limites e dito, "olha, agradeço o convite, mas eu não tenho competência para ocupar esse espaço". Mais digno, não é mesmo? Logo, quando a pessoa aceitar fazer aquilo que ela não domina, ela fica sujeita às críticas, eu sinto muito, o mundo funciona assim.
Essa questão das Escolas de Samba tirarem a oportunidade das mulheres da comunidade que cresceram naquele espaço, que possuem poucas oportunidades de protagonismo, sempre me incomodaram demais. Tirar dessas mulheres essa oportunidade é um crime, a meu ver. Espero que esse debate se ascenda e que a Escola de Samba volte às suas origens, porque, só para variar, sempre quem perde espaço é a ponta mais fraca, não é mesmo? Toda a minha solidariedade às passistas que perdem essa oportunidade para outros que não tem competência para estar ali e cujo merecimento é algo tão fútil.
Finalizando, eu odeio ter que fazer críticas à classe das mulheres, já tão estigmatizadas, que enfrentam tantas dificuldades, mas simplesmente, há coisas que precisam ser ditas e melhoradas.
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